Exposição “O que não se vê – Rhizomatiks” na Japan House São Paulo

Se você me segue há algum tempo ou se já fez algum curso comigo, certamente já me viu falar do Rhizomatiks e sabe que sou apaixonado pelo trabalho deles e do TeamLab.

Imaginem então a felicidade que foi saber da nova exposição na Japan House São Paulo, intitulada O que não se vê – Rhizomatiks, com curadoria de Natasha Barzaghi Geenen e a primeira na América Latina a concentrar vários trabalhos do coletivo que funde arte e tecnologia com uma visão sui generis de como esse encontro entre o tecnológico, o artístico e o humano acontece.

No último dia 11, estive na pré-exposição a convite da JHSP e pude prestigiar as instalações e os projetos feitos pelo Rhizomatiks ao longo de sua carreira. Hoje venho falar um pouco sobre cada espaço da montagem e mostrar algumas fotos maravilhosas que nos foram cedidas pela Japan House!

Sensing Streams 2022 – invisible, inaudible

Criada em parceria por Ryuichi Sakamoto e Daito Manabe, essa instalação “detecta ondas eletromagnéticas por meio de uma antena e torna visíveis e audíveis as diferentes frequências dessas ondas em tempo real por meio de uma grande tela de LED, de mais de 10m² com alta definição e alto-falantes”. O mais legal é poder interagir com a obra utilizando uma espécie de controlador que nos permite mudar a frequência e o comprimento de onda, o que altera em tempo real as imagens e as sonoridades exibidas na tela LED. A ideia da obra é fazer refletir sobre a omnipresença das ondas eletromagnéticas em nossas vidas cotidianas, despertando nossa sensibilidade para esse fenômeno que normalmente passa despercebido, embora seja essencial para a atual infraestrutura das sociedades, tal como nos smartphones.

Foto: Marina Melchers

Optical Walls

Desenvolvida pelo prestigiado engenheiro de hardware Yoichi Sakamoto em colaboração com a Mitsui Chemicals, uma grande entusiasta de inovações industriais aplicadas à arte, Optical Walls é composta por feixes de LED que atravessam lentes especialmente criadas para o projeto e que permitem que a luz se concentre em feixes paralelos e lineares. Em uma sala toda enevoada, esses feixes criam formas geométricas que percorrem as paredes e parecem nos mostrar algo que outrora estava oculto pela névoa. Sakamoto comenta que sua intenção com Optical Walls é evocar a sutileza dos fenômenos da natureza ditos simples, mas que apresentam grande complexidade e são muito importantes para a vida na Terra, como é o caso a inclinação do nosso planeta, responsável por inúmeras alterações ambientais e pelas estações do ano, para citar apenas alguns exemplos.

Foto: Marina Melchers

Gold Rush” – Visualization + Sonification of OpenSea activity

A última instalação volta seu foco para o mundo digital, em especial para a tendência dos NFTs e da CryptoArte, que seriam a versão contemporânea da Febre do Ouro que ocorreu em vários momentos e lugares ao longo do século XIX. Opiniões a favor e contrárias a esse mercado estão circulando cada vez mais intensamente, mobilizando especialistas em arte, historiadores, sociólogos, colecionadores; enfim, toda a cadeia em torno da arte, uma vez que o NFT e todo o universo cripto chegam com novas regras, estruturas e lógicas que prometem, ao menos, chacoalhar o mercado de arte tradicional que opera essencialmente baseado em obras físicas. O motivador dessa instalação do Rhizomatiks foi o frisson causado pela venda da obra digital “Everydays: The First 5000 days” do célebre artista Beeple em 11 de março de 2021 na casa de leilões Christie’s pela impressionante quantia de U$S69.346.250 (na verdade, a transação foi paga utilizando a criptomoeda Ether e pasmem: esse não é o NFT mais caro já vendido!). A “Gold Rush” – Visualization + Sonification of OpenSea activity é então um registro das 24 horas anteriores e posteriores ao dia do leilão dentro da OpenSea, uma das principais plataformas de negociação de NFTs. 

Foto: Marina Melchers

Sou culpado pra falar, já que vocês sabem que esse assunto me interessa muitíssimo, mas essa instalação é disparadamente minha favorita. Além de trazer todo esse contexto que eu mencionei acima, o Rhizomatiks usou machine learning (aprendizado de máquina) e deep learning(aprendizagem profunda), duas técnicas de Inteligência Artificial que também intencionam revolucionar todos os domínios da vida e da cultura, criando uma composição demonstrativa do dinamismo das relações e das interações entre pessoas e máquinas. Incrível, né?

Rhizomatiks Archive & Behind the Scenes

Por fim, esse espaço foi criado para quem quer entender melhor os bastidores dos projetos do Rhizomatiks e ter contato com alguns dos objetos (como drones e circuitos) usados pelo coletivo na construção de trabalhos muito conhecidos, tais como videoclipes com a girlband Perfume e com o grupo Ok Go. Percorrendo o início do Rhizomatiks em 2006 até 2021, é possível ver por que ele se tornou tão popular e apreciado, uma vez que seus trabalhos incluem desde o desenvolvimento de hardwares até montagens inteiras em espaços imensos. Falei ontem no nosso Instagram sobre Daito Manabe, um dos fundadores do Rhizomatiks, e sobre seu desejo de delinear as interrelações e as fronteiras entre o analógico e o digital, entre o real e o virtual por meio da observação cuidadosa que elucide as possibilidades inerentes ao corpo humano, aos dados, à programação, aos computadores e a outros fenômenos, como ele mesmo relata em seu website.

Foto: Marina Melchers

Isso fica muito evidente na exposição O que não se vê – Rhizomatiks, já que navegamos por inúmeros universos e somos convidados a fazer e refazer conexões o tempo todo. Gosto muito dessa proposta de chamar nossa atenção para aquilo que está à nossa volta, mas que foi tão naturalizado a ponto de passar despercebido, sendo esse, inclusive, um dos traços da obra de Kunihiko Morinaga que analisei durante meu mestrado. Essa sensibilidade (não exclusiva, mas muito presente em artistas japoneses) é algo extremamente atraente, que nos tira da zona de conforto e abre mais e mais portas para pensar além. E aliás, não é bacana que essa exposição tenha começado justamente na mesma semana em que fomos presenteados com tantas fotos de tirar o fôlego feitas pelo Telescópio Espacial James Webb, mostrando-nos também aquilo que não podemos ver em um universo mais vasto e complexo do que imaginamos?

Enfim, já comecei a divagar, mas isso é sinal de que a exposição ecoou na cabeça, né? Aconselho muitíssimo que você faça uma visita à Japan House caso passe por São Paulo entre 12 de julho e 2 de outubro. E leve o celular, porque foi criado um web app exclusivo com ainda mais conteúdos sobre as obras, sobre o Rhizomatiks e sobre arte, tecnologia e ciência em geral. 

Lembrando também que, enquanto o Rhizomatiks ocupa o andar térreo, a KUMIHIMO – A arte do trançado japonês com seda, por Domyo (leia a resenha aqui) continua até 28 de agosto no segundo andar. A coexistência entre o tradicional e o ultracontemporâneo!

Agradeço toda a equipe da JHSP pelo convite para a pré-exposição e aproveito também para parabenizá-los pelo árduo trabalho e por nos trazerem essas propostas certamente únicas!

E se você der um pulinho lá, não se esqueça de nos contar o que achou!

Texto originalmente publicado pelo autor no Portal JAPONI.


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