Apesar de apresentar suas coleções em Paris, Chitose Abe é pouco conhecida fora do círculo dos iniciados e, diria eu, que sua produção é mais habitual aos iniciados em moda japonesa. Durante várias aulas e cursos que tive sobre história da moda, jamais ouvi falar sobre ela, assim como também nunca havia ouvido falar de Morinaga e da ANREALAGE antes de visitar a exposição da Japan House São Paulo em 2019.
Fundada em 1999, a sacai se consolidou por seu design híbrido entre a elegância e casualidade, entre roupas de festa e roupas de trabalho. A trajetória de Abe é pertinente para a construção dessa identidade, já que de sua passagem pela Comme des Garçons e pela Junya Watanabe (cujo designer também é “filho” de Rei Kawakubo), ela provavelmente retirou elementos para elaborar suas peças de linhas minimalistas, estruturadas, que transmitem confiança enquanto permanecem leves e descontraídas.
Destaco que Abe já participou de importantes colaborações, dentre elas com a Nike (uma em 2015 e outra em 2018) e com a Apple e a Beats Eletronics para o desenvolvimento dos fones exclusivos BeatsX em 2019. Em 2020, foi anunciada como responsável pela coleção de outono/inverno 2021-22 de Alta Costura da Gaultier. Ela foi a primeira convidada de uma série de colaborações que a Gaultier fará após o anúncio da aposentaria do criador da marca e, até então seu diretor-criativo, Jean Paul Gaultier.
O resultado foi muito elogiado pela mídia especializada, com especial ênfase para o resgate de referências clássicas de JPG, como o sutiã cônico, mas reinterpretado pela hibridização de Abe, que nos entregou camisas que também são saias, vestidos que também são jaquetas, alfaiatarias em riscas de giz (outra assinatura de Gaultier) feitas em transparências provocativas e deixando entrever modelos todas tatuadas… Enfim, um belíssimo trabalho que fundiu o melhor das duas marcas e, mais do que isso, evidenciou ainda mais a competência, criatividade e técnica de Abe.
Em nosso aquecimento para a Semana de Moda de Paris (temporada outono/inverno 2022-23) que se inicia no próximo dia 28, propus revistar alguns desfiles e, semana passada, comentei sobre a primavera/verão 2022 de Issey Miyake. Gostaria então de falar brevemente sobre a coleção da sacai, também apresentada em formato de fashion film e que trouxe a imponente e célebre Tokyo Tower parte de seu cenário.
O desfile, infelizmente curto, chamou minha atenção por ser extremamente urbano, com as modelos chegando em um grande ônibus de viagem que estaciona na base da Tokyo Tower, onde a apresentação começa. Como esperado, peças híbridas, assimétricas e que poderiam ser usadas tanto em um evento mais suntuoso quanto no dia a dia, a depender dos acessórios, maquiagem e de outros detalhes.
A paleta de cores, majoritariamente neutra, teve o que chamo de “invasões de cores”, com verdes, vermelhos e laranjas pontualmente utilizados para criar zonas focais que conferiram dinamismo e jovialidade para as roupas. Normalmente, não sou muito fã de animal print, mas confesso ter sido interessante as combinações com bege e preto em looks noturnos, com uma finalização bastante equilibrada.
No geral, achei a primavera/verão 2022 da sacai extremamente moderna, cosmopolita, funcional e poderosa. Itens versáteis, que podem ser usados em diversas ocasiões, misturando uma pegada comercial com uma experimentação que Abe vem desenvolvendo ao longo de sua carreira.
O que será que vem por aí para o outono/inverno 2022-23?
Texto originalmente publicado no Portal JAPONI.
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